quinta-feira, 29 de julho de 2010

Vigiando os vigias

Como o modelo de Segurança Pública, adotado pelo Estado brasileiro, chegou ao seu limite e a falta de uma política consistente e de valorização dos profissionais

*Antonio Jorge Ferreira Melo

Como o modelo de Segurança Pública, adotado pelo Estado brasileiro, chegou ao seu limite e a falta de uma política consistente e de valorização dos profissionais resulta no aumento generalizado da violência e da criminalidade, agora não só o cidadão, mas o próprio Estado passou a ser refém do descaso dos seus governantes.
Nesse sentido, a notícia da contratação de empresas de segurança para proteger delegacias de Polícia em São Paulo soaria até engraçado, se não soasse como um alerta para algo mais profundo, mais assustador e mais grave: além do Estado estar perdendo o controle e a capacidade de manter a ordem social em seu território, o lucro capitalista sai mais barato que a ineficiência administrativa, o descaso com o dinheiro do Estado e a completa falta de iniciativa e resolutividade do (des)serviço público.

No momento em que o Brasil e a Bahia sofrem com a falta de uma política pública de segurança que consiga dar prioridade à prevenção criminal, promovendo a integração com áreas sociais (educação, saúde, esporte, lazer, emprego e renda), em busca de culpados, afirma-se que o serviço público não funciona e, na condição de cidadão e de profissional de segurança, sou forçado a concordar.

Aliás, nenhum sistema público funciona quando os cidadãos se transformam num bando de ovelhas assustadas que se encolhem no grupo enquanto os lobos rondam, pois, enquanto a população sofre com a insegurança, em meio à falta de recursos para os necessários investimentos no setor, os governantes preferem esbanjar recursos públicos na sua autopropaganda.

Se o caminho da saúde não é o do tratamento das doenças, isto é, a vertente curativa, mas sim a promoção de saúde e a prevenção da doença. Privatizar a segurança pública é alavancar a vertente curativa que apenas dá lucro a quem interessa (privados) menos aos cidadãos que terão que continuar convivendo com as suas doenças, ou seja, com a violência, a criminalidade, e com menor qualidade de vida.

Quando se entende que os lucros são apropriados por uma minoria, e os prejuízos – o desemprego e a miséria – socializados, fica mais fácil compreender que menos serviços públicos, maior a parcela da população excluída do acesso aos serviços pagos e que morrer porque uma seguradora recusou o tratamento ou morrer por estar numa lista de espera por uma vaga na UTI é morrer da mesma maneira.

E me desculpem se estou sendo alarmista, espero estar redondamente enganado, mas basta uma análise superficial das transformações sofridas pelo processo de produção do bem segurança pública, focando a posição preponderante assumida pela segurança privada no conjunto dos mecanismos contemporâneos de controle social, para ficarmos com a impressão crescente de que o nosso futuro se assemelha aos humanos da Matrix. E de que Hayek estava certo pelas razões erradas: um economista não pode ser apenas um economista.

Tenho consciência de que, hoje, já não há instituição estatal que se possa considerar livre da privatização, como não há serviço público defendido da hipótese de ser sacrificado no altar do mercado livre. A privatização não se detém, nem sequer perante o núcleo central do Estado, o monopólio da violência. Mas a segurança pública é um bem essencial, não pode ser um serviço que se mercantilize como se de uma compra e venda se tratasse.

Privatiza-se tudo: saúde, educação, rodovias, praias, florestas. E, nessa lógica, finalmente, num futuro não tão distante, privatiza-se a Justiça, a Lei e a Segurança Pública, entrega-se por uma vez a proteção do próprio Estado a empresas privadas, com a privatização das Forças Armadas e da Polícia. E em vez de eleger um presidente, contrata-se um. Podíamos começar pelo, Erik Prince, dono da Blackwater, só para testar o conceito…
É pouco ambicioso? Mas, se é para a guerra civil, avisem desde já!

* Antonio Jorge Ferreira Melo é coronel da reserva da PM-BA, professor e pesquisador do Progesp (Programa de Estudos, Pesquisas e Formação em Políticas e Gestão de Segurança Pública) da Ufba, da Academia de Polícia Militar e da Estácio FIB.

À QUEIMA ROUPA

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