sábado, 30 de janeiro de 2010

Oficial da BM indigna-se diante dos índices de criminalidade

Morador de Porto Alegre, Sérgio Lemos Simões, 48 anos, sente-se inseguro e exige ação das autoridades para derrubar os índices de criminalidade. Seria um anseio idêntico ao de qualquer outro cidadão, não fosse ele um dos mais importantes oficiais da Brigada Militar.

O tenente-coronel, comandante do 11° Batalhão de Polícia Militar, chefia cerca de 300 PMs que atuam na Zona Norte – região onde vivem cerca de 600 mil pessoas. Diante da ingrata rotina de prender bandidos que acabam soltos em poucos dias ou em questão de horas, Simões faz um desabafo comum a civis cuja proteção fica sob sua responsabilidade: “Ninguém aguenta mais isso”.

Ele se refere a casos como o da traficante Luciana Lopes, 26 anos, presa pela quinta vez em menos de um ano. Nas outras oportunidades, por decisão judicial, acabou solta e voltou a abastecer o mercado de drogas. Há três décadas na BM, o tenente-coronel cobra mudanças de postura de deputados e do Judiciário. Confira trechos da entrevista concedida ontem a ZH:

Zero Hora – ZH mostrou ontem o caso de uma traficante presa cinco vezes em menos de um ano. As polícias prendem sempre os mesmos criminosos?
Tenente-coronel Sérgio Lemos Simões – Não mudou nada. Anteontem (terça-feira), prendemos aqueles dois vagabundos que fizeram o sequestro relâmpago do filho de um coronel. Os dois caras com uma baita ficha criminal. E a ficha criminal é uma parte mínima, é quando ele (o bandido) foi preso. Nós chamamos de cifra negra tudo o que ele fez e ninguém viu, e ele não foi preso. No mínimo, é 10 vezes mais do que a ficha verdadeira dele. Todas aquelas maldades que ele fez mas não foi preso.

ZH – Qual a sensação que isso deixa para um policial?
Sérgio – A sensação que fica é de descrédito nas instituições. Quando tu prendes um delinquente de madrugada, e este delinquente é solto na tarde do mesmo dia, isso gera um descrédito, por parte dos policiais, nas instituições. Quando um cara rouba oito vezes no bairro Petrópolis e é solto oito vezes, não tem polícia que aguente uma coisa dessas.

ZH – A que instituições o senhor se refere?
Sérgio – Todo mundo sabe que é o legislador federal que tem a capacidade de mudar as leis. Por que eu cobro dos estaduais? Porque eles podem abrir o caminho para nós. Quem é o nosso elo com o deputado federal, não é o deputado estadual? Não é a pessoa que tem conhecimento, contato, que pode nos ajudar, ajudar a sociedade? Eles podem fazer isso para nós. Nós temos recursos para construir presídios em Brasília, mas onde está o empenho para liberar essas verbas? Onde está o empenho para modificar o Código Penal, o Processo Penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), para regredir a maioridade penal? Onde está o empenho? A construção da segurança pública é feita a três mãos.

ZH – Quais?
Sérgio – O Executivo, que é o primo pobre, o Legislativo e o Judiciário. Essa construção da segurança pública tem de ser feita a três mãos.

ZH – Sem essas mudanças na lei que o senhor defende, qual é na prática o papel da polícia hoje?
Sérgio – Retrabalho, resserviço, dinheiro que poderia ser investido em equipamentos para a polícia, em escolas. É dinheiro posto fora, porque tu prendes o cara num dia, no mesmo dia ele vai voltar a roubar. Tu tens de tratar de maneira desigual os desiguais. Um cara que é analfabeto, sem qualificação nenhuma, que só sabe roubar, causar dor e sofrimento, tem de ficar preso. Aí tu pegas a nossa legislação penal. Um sexto da pena, tendo bom comportamento, passando nos laudos psicológicos, e o cara está solto. Isso é absurdo. Tem de cumprir no mínimo metade da pena. E, a cada reincidência, ela tem de ser agravada. Outra coisa que tem de ser modificada com urgência é o juiz passar a analisar a reincidência.

ZH – A reincidência não é levada em consideração?
Sérgio – Só depois de transitar em julgado o primeiro fato. Se tu pegas um cara que em 2009 cometeu nove crimes, enquanto ele não for julgado pelo primeiro, ele vai continuar sendo preso e solto, preso e solto. Ninguém aguenta mais isso.

ZH – Isso frustra a tropa de maneira geral?
Sérgio – Mas é claro, se eu que sou tenente-coronel fico frustrado, tu imaginas o meu soldado. É impressionante, cara, é impressionante. Não defendo que o camarada vá apodrecer na cadeia, não é isso. Não sou um reacionário, um retrógrado, um maluco. Eu defendo que o cara fique segregado. Tu preferes alguém causando dor e sofrimento para a tua família ou preso? Um cara que não sabe fazer outra coisa na vida a não ser roubar e causar sofrimento. Quer que ele fique na rua assaltando a tua mãe, teu pai, teus irmãos? É isso?

ZH – Ninguém quer isso...
Sérgio – Eu admiro o humanismo do Judiciário, o humanismo dos Direitos Humanos, admiro tudo isso, mas a minha obrigação é defender a sociedade. Todo agente público tem por dever defender a sociedade. É pró-sociedade. Nós, o soldado da Brigada Militar, o legislador e o juiz. Entre o delinquente ficar na rua, causando dano, dor e sofrimento, ou ficar preso, ele tem de ficar preso. Por isso eu cobro dos legisladores e cobro dos julgadores. O legislador tem de ser mais ágil, tem de modificar a lei, nos ajudar a modificar a lei. E o julgador tem de nos ajudar a manter esses camaradas presos.

ZH – O senhor entende que apenas o policial é cobrado?
Sérgio – Quem é que tu vês na rua? Tu vês o juiz na rua? Tu vês o legislador na rua? Quem tu vês na rua? É o policial. Então tu cobras de quem tu vês. Por isso, a ideia que eu tinha era de proibir meus policiais de irem a reuniões comunitárias. Porque eu já cansei de dar explicações. Não tem mais o que explicar. Então deixa para o legislador explicar, para o juiz explicar. Ele vai lá e explica o que é o garantismo (filosofia jurídica que prevê a garantia dos direitos do cidadão frente ao Estado), os nossos deputados explicam por que tem milhões para construir presídios em Brasília e esse dinheiro não vem, explicam por que não modificam o ECA e o processo penal.

ZH – O senhor mantém a intenção de proibir os policiais de irem a essas reuniões?
Sérgio – Proibir os oficiais e praças de irem às reuniões comunitárias só iria piorar a situação, porque mais desamparados eles (os cidadãos) ficariam. Essa minha colocação fez nada mais nada menos do que botar o bode na sala. Pô, esse cara criou um problema...

ZH – A situação na área de segurança pública está piorando?
Sérgio – Isso é importante. Por incrível que pareça, os índices de criminalidade têm baixado, mas em níveis insuportáveis. Baixou, mas continua ruim. É o cara que está com 45 graus de febre. Baixou para 40. Não é alarmismo, os índices baixaram, principalmente no mês de janeiro, mas tem de levar em conta que o pessoal está na praia. Na Zero Hora saiu uma reportagem com os índices de aprovação do governo do Estado, e o pior índice é o da segurança pública. É uma série de fatores que tem de trabalhar junto. Se ficar só com a Brigada, só com a Polícia Civil, não tem como. O cara que é preso tem de ficar preso.

ZH – E o argumento de que não há presídios em condições adequadas para receber esses presos?
Sérgio – Não é problema meu, não é problema do cidadão, não é problema do teu pai e da tua mãe que pagam impostos. O cara rouba 10 vezes num ano e 10 vezes é solto, rapaz. E o juiz entende que o crime não foi violento? Mas para aí, temos de esperar o que para ele ir realmente preso? Que mate alguém?

ZH – Hoje, dos criminosos que vocês prendem, só segue preso quem comete crime grave?
Sérgio – Só quando comete algo gravíssimo. E o patrimônio? E o dinheiro que tu ganhas todo mês para comprar um carrinho, uma TV, um rádio, aí um vagabundo leva. Isso não é grave? O cara quebrar o vidro do teu carro, levar o som do teu carro, não é grave? Onde é que nós estamos? Onde nós vamos parar? Agora vou abrir o meu coração. O nosso Poder Legislativo é descompromissado com relação aos temas da segurança pública. Três anos temos dessa legislatura. Me diz os projetos na área da segurança. Tinha um das tornozeleiras eletrônicas. Onde anda isso?

ZH – Parado?
Sérgio – Rodou outro aí sobre os desmanches. Onde anda isso aí? Qual é o empenho em relação à segurança pública? Na minha opinião, é uma Assembleia descompromissada com os assuntos da segurança pública. Em três anos, nossos deputados estiveram mais preocupados com o pufe da Yeda, a casa da Yeda e da filha da Yeda, com CPIs que não levaram a nada. E a segurança pública, e a dor das pessoas na rua?

ZH – Que medidas o senhor entende que poderiam ser tomadas?
Sérgio – O deputado estadual não legisla sobre temas penais, mas poderia fazer pressão em Brasília para nos ajudar a tentar mudar o estado de coisas. Aí entra o deputado federal, principalmente. Tu abres o jornal, e sobre o que os deputados falam? Que vão compor com tal partido. E a segurança pública? Eu, não como tenente-coronel, mas o cidadão Sérgio Lemos Simões, que paga imposto, eu exijo que o Legislativo e o Judiciário me deem segurança. Eu exijo que me deem segurança.

ZH – O senhor não se sente seguro?
Sérgio – Eu não me sinto seguro. Como eu vou me sentir seguro, cara? Tu achas que eu fico tranquilo quando um filho meu sai à noite em Porto Alegre? Pergunta para qualquer um nessa cidade se fica tranquilo quando o filho sai à noite. Nós precisamos de empenho, de compromisso, trazer verbas para construir presídios. Precisamos de pessoas com capacidade e determinação para mudar esse estado de coisas. Se ficar só nas costas do policial, não tem como.

Contrapontos

O que diz Ivar Pavan, presidente da Assembleia Legislativa
Acho estranha essa crítica. Não há legislação tramitando na Assembleia que possa melhorar a vida da segurança, mas a segurança não melhora só por leis. Quem comanda a segurança é a governadora, ela tem o orçamento e define as políticas de segurança que são aplicadas. Por isso, acho que as críticas vieram para o endereço errado. Quanto à possibilidade de intervenção para promover mudanças na legislação penal, esse é um debate que vem de muitos anos. Além disso, o governo federal tem atuado nessa área. Cerca de 20 mil policiais gaúchos recebem bolsa para formação.

O que diz Carlos Marchionatti, presidente da Ajuris
Os juízes devem cumprir a lei e interpretar os casos. Mas há situações em que os juízes mandam prender, e a polícia não prende. Outras vezes, a polícia prende, mas o juiz verifica que a prisão não pode ser mantida. Há milhares de mandados de prisão que as autoridades policiais não conseguem cumprir. Não faço essa menção como crítica, mas para ampliar a análise. A questão dos antecedentes é uma discussão jurídica polêmica, porque a Constituição estabelece que só se considera culpado após transitado em julgado. Mas os juízes levam em consideração os antecedentes criminais e, muitas vezes, determinam prisões baseados nisso. Os juízes também têm formas diferentes de pensar. Acima de tudo, têm de cumprir a lei.

Exemplos de impunidade

Repetidas prisões e crimes cometidos por reincidentes chamam a atenção. Confira alguns casos emblemáticos:

- Traficante reincidente – Na quinta-feira, uma operação do Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc) resultou na prisão de Luciana Lopes, 26 anos, em flagrante por tráfico de drogas em Porto Alegre. É sua quinta prisão em menos de um ano. Ela tinha 94 pedras de crack. Pequenos traficantes como Luciana representam 85% das detenções feitas pelo Denarc, e costumam ficar dois meses na cadeia.
- Jovem assassinado – Dia 7 de janeiro, aprovado para um curso superior de Engenharia e prestes a noivar, o estudante Diogo Pinheiro da Cruz, 19 anos (foto), foi morto em Caxias do Sul com dois tiros à queima-roupa. Um dos envolvidos no crime, Rodrigo Hofman Góis, 24 anos, havia sido detido anteriormente por porte ilegal de arma, mas acabou solto. Cruz, o mais velho de quatro irmãos, morreu por R$ 500.
- Ladrão preso nove vezes – Fabrício Almeida de Azevedo, 20 anos, foi pego em outubro carregando objetos de uma academia de ginástica no bairro Petrópolis, em Porto Alegre. Era sua nona prisão em um período de um ano em situações semelhantes. Nas oito vezes anteriores, acabou solto depois de passar poucos dias na prisão.

Fonte: Zero Hora, por Marcelo Gonzatto

marcelo.gonzatto@zerohora.com.br

domingo, 24 de janeiro de 2010

Xerife do Tolerância Zero afirma que é a hora de o Brasil investir em Segurança


William Bratton, ex-chefe de polícia de Nova York e Los Angeles, dá dicas para debelar o crime

O Brasil está diante de uma oportunidade histórica para derrotar o crime. Quem garante é o homem que pacificou duas metrópoles americanas – Nova York e Los Angeles.
Quando William Bratton, 62 anos, assumiu o comando da polícia nova-iorquina com a promessa de vencer a guerra contra os bandidos, a cidade era considerada um caso perdido, assim como o Rio. Lá se matavam mais de 2 mil pessoas por ano. Em 1994, poucos acreditaram no xerife da tática conhecida como Tolerância Zero. Mas ele conseguiu.
De 2002 ao final do ano passado, período em que chefiou os policiais de Los Angeles, repetiu a promessa. Igualmente a cumpriu, encolhendo as estatísticas de crime. As cidades, que estavam entre as mais violentas dos Estados Unidos, são hoje duas das mais seguras. Agora, o homem que recebeu o apelido de “top cop” (maior policial) americano volta seus olhos para o Brasil – e com otimismo.
Recém aposentado do serviço público e integrado à empresa americana de consultoria em segurança Altegrity, Bratton virá ao país para uma palestra entre março e abril, em São Paulo.
Ele garante que o crescimento econômico e a proximidade de eventos como a Copa do Mundo e a Olimpíada criam um momento único para revolucionar a segurança urbana.

Confira os principais trechos da entrevista de Bratton concedida a ZH, por telefone, de Nova York:

Zero Hora – O que o senhor mudaria em primeiro lugar no sistema brasileiro de segurança pública?
William Bratton – Passei por uma experiência no Brasil, em 2000, 2001 e 2002, quando estive trabalhando para o ex-governador (Tasso) Jereissati no Estado do Ceará, particularmente na cidade de Fortaleza. Tivemos algum sucesso reduzindo índices de criminalidade, e pude conhecer o seu sistema de Justiça criminal. Ele tem problemas em termos de falta de coordenação e colaboração entre os vários componentes. Às vezes devido à estrutura organizacional, às vezes porque há diferenças entre as organizações, e nem sempre há vontade de colaborar e se coordenar umas com as outras.

ZH – O fato de termos duas polícias faz parte disso?
Bratton – Sim, mas até mesmo se pegarmos apenas a Polícia Militar, por exemplo, os praças formam um grupo separado dos oficiais, são classes bastante separadas. É potencialmente problemático porque você tem diferentes classes no serviço. E a Polícia Civil, os seus delegados, são outra classe, são advogados, que não trabalharam no patrulhamento ostensivo antes de virar policiais civis. E há os promotores, que são completamente separados disso.

ZH – Nos EUA, o fato de haver uma polícia única ajuda?
Bratton – Temos um sistema em que todos começam como policiais de rua que podem subir na organização e se tornar um detetive, um supervisor, um oficial de comando, um comissário. Mas todos começam como policiais trabalhando nas ruas, e quase nunca se vê alguém que comanda um departamento de polícia que não tenha subido por essa hierarquia. No meu caso, por exemplo, em 1970 eu comecei como guarda, virei sargento, tenente, superintendente, comissário de polícia de Boston, depois comissário de Nova York e, mais recentemente, chefe de polícia de Los Angeles. No Brasil, isso não ocorre, e isso é problemático para ter um sistema de Justiça criminal que funcione.

ZH – Aqui as diferenças culturais são uma barreira?
Bratton – Há níveis educacionais diferentes. Alguns policiais civis têm diploma de Direito e, para ser um praça da Polícia Militar, você precisa de um diploma de Ensino Médio. Além disso, os oficiais e os chefes de polícia vêm, muitas vezes, de uma outra classe social. Há muitas diferenças de educação, de classe, profissionais. Nos EUA, detetives, praças, policiais e comandantes são parte da mesma organização. Essas são questões que precisam ser reconhecidas em uma tentativa de melhorar a coordenação, o compartilhamento de informação e inteligência. Começamos a fazer isso com algum sucesso em Fortaleza, mas então o contrato acabou e me tornei chefe de polícia em Los Angeles.

ZH – O senhor repetiria a experiência no Brasil?
Bratton – Estou muito interessado em voltar ao Brasil. O seu país passou por uma transformação fenomenal. Quando eu estive aí, sua economia estava lutando, as taxas criminais eram terríveis, mas agora vocês se tornaram a potência econômica da América do Sul. Vocês têm uma das economias mais fortes, o país está crescendo positivamente, e uma evidência disso é que vocês têm a Copa do Mundo e a Olimpíada. Isso demonstra ao mundo que vocês cresceram muito, mas o problema que vocês ainda enfrentam é a segurança pública.

ZH – Hoje o cenário é mais propício para mudar o quadro da segurança?
Bratton – Vocês têm hoje uma oportunidade crucial para os governos decidirem investir na infraestrura de segurança pública. Há uma grande oportunidade, com grande potencial de sucesso. Se vocês tiverem líderes dispostos a investir em segurança e a experimentar, vocês podem ter sucesso. Esta é a hora de o Brasil investir em segurança. Essa é a oportunidade, com a Olimpíada e a Copa do Mundo se aproximando, de mostrar o Brasil para o mundo.

ZH – Alguns dos problemas se referem a investimentos, como falta de pessoal, de equipamentos, baixos salários. Isso de fato é essencial para uma política de segurança eficiente?
Bratton – Nos EUA, temos uma expressão: você recebe pelo que paga. Se você não paga para ter policiais educados, motivados e honestos, você terá policiais sem educação, desmotivados e desonestos. Em Nova York, (Rudolph) Giuliani, e em Los Angeles, (Antonio) Villaraigosa, esses prefeitos entenderam a importância de aumentar a força policial, de investir em pagamento, equipamento e tecnologia. Agora que seu país está emergindo como potência econômica, tem mais riqueza do que tinha, assim como o Rio de Janeiro se prepara para a Olimpíada, precisa considerar investir bem mais dinheiro e recursos em segurança pública. Em uma democracia, a primeira obrigação de um governo é garantir a segurança pública.

ZH – O senhor citou o Rio de Janeiro...
Bratton – Li no New York Times uma reportagem muito interessante sobre o Rio de Janeiro. Para mim, é muito curioso porque é o que nós começamos a fazer em Nova York, em 1996. Tínhamos uma operação chamada Juggernaut. Nós usávamos milhares de policiais para tomar áreas dos traficantes de drogas e, uma vez que nós recuperávamos essas áreas, deixávamos muitos policiais na região para garantir que os traficantes não voltariam. Depois disso, passávamos para as áreas seguintes. Em um período de dois anos, atravessamos a cidade, reduzindo crimes. Como no Rio.

ZH – O senhor se refere às unidades de polícia pacificadora?
Bratton – Sim. Muitas áreas das suas cidades são deixadas à mercê dos grandes traficantes. A polícia não fica rotineiramente nelas. Geralmente usam forças de ataque quando entram, empregando muita violência, então vão embora e as gangues retomam o controle. No Rio, há um esforço não apenas para entrar, mas para permanecer. Mas isso exige muitos policiais e bons salários para que não se corrompam. É preciso haver otimismo sobre isso.

ZH – Havia otimismo em Nova York?
Bratton – Quando fui para Nova York, em 1994, ou para Los Angeles, em 2002, não havia muito otimismo nessas cidades de que poderiam fazer muito contra o crime, e elas fizeram. Nova York é hoje uma das cidades mais seguras do mundo, e a mais segura grande cidade americana. Los Angeles é a segunda cidade de grande porte mais segura dos EUA, depois de anos de domínio de gangues. Em Nova York, o crime vem caindo todo ano há 19 anos. Em Los Angeles, caiu durante todo o tempo em que estive lá. Então, sou um otimista, sou muito bom no que eu faço, seja quando sou o chefe de polícia ou quando presto consultoria a governos.

ZH – Por que o senhor virá ao Brasil?
Bratton – Vou a São Paulo porque o Departamento de Estado dos EUA me convidou para falar sobre minha experiência. Mas também fiquei muito interessado no que está ocorrendo no Rio, porque você não pode fazer tudo em todos os lugares, em grandes áreas como Nova York ou São Paulo. Você não tem como fazer tudo ao mesmo tempo, você tem de ir fazendo área por área. O Rio entendeu isso.

ZH – O senhor já sabe com quem deverá se encontrar?
Bratton – Devo me encontrar com representantes de governos da região de São Paulo, que demonstraram interesse em conversar comigo sobre minha experiência após uma entrevista que dei para uma TV e um artigo publicado em uma revista.

ZH – Há uma preocupação muito grande no país em encontrar uma saída para a violência.
Bratton – Você pode ter um emprego, mas se você tem medo de ser assaltado no caminho para casa, ou se você agora tem uma televisão, mas ela é roubada, ou se suas crianças ficam em perigo ao ir para a escola, mesmo que a sua condição econômica tenha melhorado, se a segurança pública não melhorou, você vai viver com medo. A melhora econômica precisa ser acompanhada por uma melhora dramática na segurança pública.

ZH – E isso não é automático?
Bratton – Não é automático. Tem de ser planejado, tem de ser apoiado, conduzido. Mas sou otimista a esse respeito.

Fonte: Zero Hora, por Marcelo Gonzatto marcelo.gonzatto@zerohora.com.br

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Gravação das Conversas Telefônicas da Quadrilha de Traficantes de Pelotas



A RBS TV exibiu hoje em seu programa "RBS Notícias" uma reportagem (veja o vídeo acima) informando que setenta e cinco integrantes de uma quadrilha presa em novembro de 2009 em Pelotas e região e na capital foram denunciados à justiça pelo Ministério Público.
Num dos trechos da reportagem aparece uma gravação telefônica feita com autorização da justiça onde um dos presos conversa com uma mulher.
Alguém achou a voz do homem familiar? Quem arrisca um palpite? 

Entre atirar ou morrer!

Em 19 de janeiro de 2009, quatro Policiais foram designados para cumprir mandados de prisão e de busca e apreensão na residência de traficantes de drogas numa cidade mineira.

Eram 6 h da manhã quando a equipe chegou ao local e se dividiu em duplas; dois Policiais entraram pela porta principal da casa e os outros dois seguiram por um corredor lateral até os fundos do lote, cercando o lugar. Um muro de concreto pré-moldado dividia a porta principal daquele corredor; por isso, tão logo as duplas se posicionaram para a entrada, elas ficaram definitivamente separadas.

De repente, a dupla que entrou pelo corredor foi surpreendida por dois indivíduos fisicamente poderosos, resistentes, ágeis, autoconfiantes, altamente inteligentes, capazes de tolerar a dor e com vontade de lutar até o fim. Se isso não bastasse, estes indivíduos carregavam uma herança genética herdada de seus ancestrais que atacavam touros, ursos, cavalos e outros cães em eventos medievais denominados Bull Baiting.

A agilidade desses indivíduos é considerada tão grande que eles são capazes de transpor muros e usar os dentes para escalar cercas de proteção. Quando estão nas ruas, eles devem usar focinheiras, enforcadores ou coleiras resistentes, sendo conduzidos com guias curtas e por pessoas com força física suficiente para contê-los no caso de ficarem violentos.

Então, ao ver os cães da raça Pit Bull “voando” em sua direção, o Policial A pensou em voltar. Mas, ele percebeu que não teria tempo, e que se fizesse isso, o Policial B ficaria sozinho com os dois cães ferozes. Os Policiais iniciaram os disparos contra os cães agressores, e com os estampidos, o Pit Bull A fugiu, mas o Pit Bull B continuou sua investida até ser incapacitado e tombar a aproximadamente 1,5 m dos Policiais.

Quando caiu, o Pit Bull B ainda estava vivo apesar de ter sido atingido duas vezes no tórax e uma vez na cabeça, numa espécie de Mozambique Drill canino. O Policial A havia disparado oito tiros, enquanto o policial B quatro vezes. Portanto, dos 12 disparos somente três acertaram o alvo, gerando um percentual de aproveitamento de 25%. O Policial A percebeu que em dado momento o animal perdeu o controle motor das patas traseiras e tentou alcançar os Policiais usando as patas dianteiras, mas logo depois tombou e parou. Só então, a dupla prosseguiu até o quintal da residência onde rendeu alguns dos alvos da operação.

Um mês depois foi protocolada na Delegacia de polícia uma requisição de instauração de Inquérito Policial para apurar possível ocorrência do crime de abuso de autoridade praticada pelos dois Policiais. A requisição foi baseada nas declarações prestadas por uma parenta dos traficantes presos e que era a proprietária dos cães agressores. Ela declarou que os Policiais, sem mandado de busca, chegaram portando armas de fogo de grosso calibre, fazendo vários disparos, inclusive matando um dos três cachorros, sendo morto um cão de pequeno porte. Se o requisitante estivesse do lado dos Policiais vivenciando tal experiência, talvez esta requisição jamais existisse.

Então, vejamos! Especialistas informam que a velocidade que um cão pode atingir depende da idade, do condicionamento físico, do gênero (macho ou fêmea), e também da motivação para correr. Cães desenvolvidos para rinhas não costumam defender seus territórios, mas atacam em função da herança genética. Portanto, não é preciso grande motivação para que um Pit Bull corra em sua direção, ainda mais se você estiver na casa dele. Desse modo, a velocidade que um Pit Bull pode atingir gira em torno de 40 a 48 km/h, isso dá cerca de 11 a 13 m/s.

Quando os Policiais perceberam a iminência do ataque, deu-se início à reação de sobrevivência (luta, fuga ou obediência), e devido às alterações fisiológicas e de comportamento cada um percebeu o tempo e a distância de modo particular. O Policial A estimou em aproximadamente 7 m a distância entre ele e os cães. Já o Policial B percebeu uma distância de 15 m. Uma análise no local do incidente revelou uma distância de quase 12 metros.

Imaginando que os cães estivessem correndo a uma velocidade de 12 m/s, e considerando uma distância de 20 metros, quanto tempo eles teriam para reagir até que os animais os alcançassem? Um segundo e sessenta e seis centésimos (1,66 s). Entretanto, um Policial comum com uma pistola, disparando o mais rápido possível, gasta 31 centésimos de segundo para disparar o primeiro tiro depois de ter percebido uma ameaça. Agora, diminua 0,31 s de 1,66 s, e você terá o tempo disponível para salvar sua vida se algum dia você vivenciar uma situação semelhante à enfrentada por estes dois Policiais, ou seja, 1,35 s. Bem otimista, não é mesmo?

Contudo, eles estavam a 15 m dos cães, de acordo com a percepção do Policial B. Assim, o Pit Bull sobrevivente correndo a 12 m/s cobriria estes 15 m em 1,25 s. Um segundo e vinte e cinco centésimos menos 0,31 s, dá 0,94 s. Agora, faça as contas para a distância de 12 m. Resultado: 0,69 s.

O Policial A atirou o mais rápido que pode com sua pistola (8 tiros), o Policial B, também com uma pistola, disparou tentando acertar (4 tiros), e apesar de nenhum deles saber quem acertou o cão, ambos sabem onde foram parar os tiros que erraram o animal (dentro da igreja vizinha dos fundos). Quem sabe, na sua próxima operação policial, você não leve aquela “velha” espingarda calibre 12!

Porém, há outro detalhe neste incidente: a perspectiva visual. Isto significa que um objeto distante parece ser menor do que um objeto mais próximo, mesmo que eles tenham o mesmo tamanho. Criadores de Pit Bulls informam que a altura da raça é de 51 cm (da cernelha ao solo, ou seja, da omoplata e as partes moles que a revestem até o chão), mas não ultrapassa os 58 cm. Então, os Policiais empunhando suas armas com os braços esticados perceberiam (na massa de mira e na posição de pé) a altura do Pit Bull B da seguinte forma: o animal a 15 m de distância pareceria ter 2,2* cm de altura; a 12 m de distância, o cachorro pareceria ter 2,7* cm de altura; a 10 m o cão teria 3,4* cm; e a 7 m ele teria 4,7* cm. Só para constar, outro Policial recomendou atirar de joelhos em situações assim!

Portanto, pense como seria atirar em algo tão pequeno se movendo rápido o suficiente para lhe alcançar em apenas um segundo. Agora, imagine o recuo da arma elevando cada vez mais o cano durante os tiros sequenciais enquanto você tenta mirar/atirar cada vez mais baixo porque o cão está se aproximando. Como seria se você simplesmente esperasse para ser atacado? Como seria ver essa fera saltando sobre você para morder com toda a força seu rosto, sua cabeça ou seu pescoço? Será que seu colega conseguiria se safar para ajudar você? Você conseguiria ajudar seu colega? Será que no meio dessa confusão, os Policiais não atirariam um no outro sem querer na tentativa de acertar o cachorro?

Infelizmente, no trabalho policial você precisa solucionar problemas violentos num piscar de olhos. Se você falhar, isso pode custar a sua vida; se você sobreviver, talvez custe sua paz de espírito, e se depender de algumas pessoas talvez custe algo mais. Portanto, aqueles que não estão presentes quando o pior acontece e não compreendem as dinâmicas e as dificuldades do trabalho policial jamais deveriam avaliar ou julgar as atitudes legítimas de autodefesa policial que ocorrem numa fração de segundo. E quando você deixar a delegacia para cumprir mandados na residência de alguém, vá preparado e sempre acredite naquela placa que diz “CÃO BRAVO”!

*Medidas aproximadas.

Artigo escrito por Humberto Wendling, Agente de polícia Federal e Instrutor de Armamento e Tiro.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

O "bafômetro" na Lei nº 9.503/97.


Ouve-se aos quatro cantos que o trânsito mata no Brasil 40.000 pessoas por ano. Excluem-se dessa estatística alarmante os inúmeros politraumatizados, muitos dos quais aprisionados a uma cadeira de rodas pelo resto da vida. Os números assustam, porém são o retrato mais límpido da realidade que nos circunda.

Mostrando-se "preocupados" com a situação, os legisladores pátrios deram mais uma inequívoca demonstração de que no Brasil se combate às atitudes que afrontam à paz social por meio de símbolos.

Como pretendemos aqui deixar um norte para a triste situação do trânsito no nosso país, direcionando a leitura para tantos quantos se interessem pelo estudo da matéria, demonstraremos o significado desses símbolos.

Estudiosos das ciências sociais, embasados em situações fáticas e corriqueiras, concluem que se combate os desequilíbrios da harmonia social com a incriminação de determinadas condutas mais acintosas à sociedade.

Analisando-se as Leis n.º 8.072/90 (Crimes Hediondos), n.º 9.034/95 (Crime Organizado) e a própria Lei n.º 9.503/97, no capítulo que trata dos crimes de trânsito, observamos que essas normas têm algo em comum: o endurecimento do regime, quer seja com o aumento das penas, quer seja com a impossibilidade de concessão de determinados benefícios, a exemplo do sursis. No que tange ao último diploma citado (CTB), poder-se-ia dizer causar espanto a afirmação de que possui elevadas penas; entretanto, considerando a legislação anterior que disciplinava a matéria trânsito – a Lei n.º 5.108/66, limitou-se o legislador por considerar determinadas condutas acintosas à paz social e ligadas ao trânsito como contravenção penal.

Cite-se, à guisa de exemplo, a conduta de conduzir veículo automotor em via pública sem possuir Carteira Nacional de Habilitação (art. 32 da Lei de Contravenções Penais – LCP), hoje elevado à categoria de crime e tipificado no art. 309 do CTB. Deixa-se um pergunta no ar: algum condutor de veículo chegou a ser apenado em decorrência da contravenção penal do art. 32 da LCP?

Diante do apresentado, urgem outras perguntas, tais como: houve efetiva aplicação das referidas leis? Diminuiram-se as condutas que se visou a coibir? A resposta é imperativa: não.

BECCARIA (1) manifestou-se no sentido de que mais vale a certeza da punição do que o quantum da pena. Imaginar-se como solução dos problemas que afligem a sociedade a incriminação cada vez maior de condutas e a elevação das penas já existentes é mero simbolismo. É fingir que se está procurando soluções. É, sobretudo, enganar o cidadão ordeiro.

Seria injusto aqui não frisar o importante papel dos juristas modernos, que, no embate diário, clamam pela despenalização e descriminalização de determinadas condutas. Vejam-se as Leis n.º 9.099/95 (Juizados Especiais), n.º 10.259/01 (Juizados Especiais Federais) e o consagrado – ainda pouco aplicado – princípio da insignificância ou da bagatela.

Feitas as considerações preliminares, por entendê-las pertinentes, passemos a abordagem do tema em si.

O Código de Trânsito Brasileiro cuida da embriaguez nos seguintes dispositivos:

"Art. 165. Dirigir sob influência de álcool, em nível superior a seis decigramas por litro de sangue, ou de qualquer...
INFRAÇÃO: Gravíssima
PENALIDADE: Multa (cinco vezes) e suspensão do direito de dirigir.
MEDIDA ADMINISTRATIVA: Retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação.
....................
Art. 269. A autoridade de trânsito ou seus agentes, na esfera das competências estabelecidas neste Código e dentro de sua circunscrição, deverá adotar as seguintes medidas administrativas:
....................
IX – realização de teste de dosagem de alcoolemia ou perícia de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica;
...................
Art. 276. A concentração de seis decigramas de álcool por litro de sangue comprova que o condutor se acha impedido de dirigir veículo automotor.
Art. 277. Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de haver excedido os limites previstos no artigo anterior, será submetido (destacamos por interesse a conclusão final) a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia, ou outro exame que por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado.
Art. 280
..................
§ 2º A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN.
.....................
Art. 306. Conduzir veículo automotor (2), na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem.
Penas: detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor."
"Resolução n.º 81, de 19 de novembro de 1998.
‘Disciplina o uso de medidores da alcoolemia e a pesquisa de substâncias entorpecentes no organismo humano, estabelecendo os procedimentos a serem adotados pelas autoridades de trânsito e seus agentes’.
O CONSELHO NACIONAL DE TRÂNSITO - CONTRAN, usando da competência que lhe confere o art. 12, inciso I, da Lei n.º 9.503, de 23 de setembro de 1997, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro, c.c. seus arts. 165, 276, 277 e conforme o Decreto n.º 2.327, de 23 de setembro de 1997, que trata da coordenação do Sistema Nacional de Trânsito, resolve:
Art.1º. A comprovação de que o condutor se acha impedido de dirigir veículo automotor, sob suspeita de haver excedido os limites de seis decigramas de álcool por litro de sangue, ou de haver usado substância entorpecente, será confirmado com os seguintes procedimentos:
I - teste em aparelho de ar alveolar (bafômetro) com a concentração igual ou superior a 0,3 mg por litro de ar expelido dos pulmões;
II - exame clínico com laudo conclusivo e firmado pelo médico examinador da Polícia Judiciária;
III - exames realizados por laboratórios especializados indicados pelo órgão de trânsito competente ou pela Polícia Judiciária, em caso de uso da substancia entorpecente, tóxica ou de efeitos análogos, de acordo com as características técnicas científicas.
Art.2º É obrigatória a realização do exame de alcoolemia para as vítimas fatais de trânsito.
Art.3º Ao condutor de veículo automotor que infringir o disciplinado no artigo anterior, serão aplicadas as penalidades administrativas estabelecidas no artigo 165, do Código de Trânsito Brasileiro - CTB, ou seja, multa (cinco vezes o valor correspondente a 180 UFIR) e suspensão do direito de dirigir.
Art.4º Ao condutor que conduzir veículo automotor, na via pública, sob influência do álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem, serão aplicadas as penas previstas no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro - CTB para os crimes em espécie, isto é, detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
Art.5º Os aparelhos sensores de ar alveolar serão aferidos por entidades indicadas pelo órgão máximo executivo de trânsito da União, que efetuará o seu registro, submetendo posteriormente a homologação do CONTRAN.
Art.6º Os aparelhos sensores de ar alveolar em uso em todo território nacional terão o prazo de 180 (cento e oitenta) dias para aferição e registro no órgão máximo executivo de trânsito da União.
Art.7º Fica revogada a Resolução n o 52/98 - CONTRAN.
Art.8º Esta Resolução entra em vigor da data da sua publicação."
"Resolução n.º 109, de 21 de dezembro de 1999.
‘Trata da homologação dos equipamentos, aparelhos ou dispositivos para exames de alcoolemia (etilômetros, etilotestes ou bafômetros).’
O CONSELHO NACIONAL DE TRÂNSITO - CONTRAN, usando da competência que lhe confere o art. 12, inciso I, da Lei no 9.503 de 23 de setembro de 1997, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro - CTB, e conforme Decreto no 2.327, de 23 de setembro de 1997, que dispõe sobre a Coordenação do Sistema Nacional de Trânsito, resolve:
Art. 1º A homologação de cada modelo de aparelho sensor de ar alveolar (etilômetros, etilotestes ou bafômetros), de que trata o art. 5º da Resolução n.º 81/98 - CONTRAN far-se-á mediante Portaria do Órgão Máximo Executivo de Trânsito da União.
Art. 2º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação."
"Portaria n.º 1, de 7 de janeiro de 2000.
O DIRETOR DO DEPARTAMENTO NACIONAL DE TRÂNSITO - DENATRAN, no uso das atribuições legais que lhe confere o artigo 19, inciso I, da Lei n.º 9.503, de 23 de setembro de 1998, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro, e considerando o disposto no art. 5º da Resolução n.º 81, de 19 de novembro de 1998, que disciplina o uso de medidores de alcoolemia e pesquisa de substâncias entorpecentes no organismo humano, resolve:
Art. 1º. Indicar o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – INMETRO para realizar a aferição dos aparelhos sensores de ar alveolar (etilômetros, etilotestes ou bafômetros).
Art. 2º. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação."

A análise dos dispositivos mencionados deixa clara a intenção do legislador de dotar a Administração Pública, por meio dos órgãos executivos que compõem a administração do trânsito, de meios efetivos de combate ao estado de embriaguez ao volante, inclusive limitando a atitude desenfreada do Estado, por intermédio da exigência de homologação pelo Departamento Nacional de Trânsito – DENATRAN e aferição dos equipamentos pelo instituto de metrologia oficial – INMETRO.

Algumas questões jurídicas, porém, vêm à tona. Senão vejamos: com o advento do CTB, em 23 de setembro de 1997, renomados juristas utilizaram-se da imprensa televisada para chamar a atenção da sociedade para o que dispõe o já citado art. 277, que determina a submissão a testes de alcoolemia ou outro exame que, por meio técnico ou científico, em aparelhos homologados (3) pelo CONTRAN, comprovem a suspeita de os condutores de veículos estarem sob a influência de álcool em nível superior a seis decigramas por litro de sangue. Visavam eles a questionar a constitucionalidade do referido artigo, amparados na máxima de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo. Entre esses juristas, encontramos GRECCO FILHO, FLÁVIO GOMES e HONORATO (4).

Outros como FUKASSAWA e MIRABETE (5), AMARAL (6), EDÍLSON JR. e MOZART BRUN (7), os dois últimos representantes do Ministério Público de Goiás, sustentam tese na defesa da constitucionalidade do multicitado art. 277 do CTB, embasando seus argumentos no princípio da legalidade e no exercício do poder de polícia. Os mencionados representantes do Ministério Público de Goiás, inclusive, entendem direcionados os ditames do artigo à autoridade, ou seja, ao poder público, como defesa do cidadão frente à mera suspeita da autoridade.

A questão, mesmo diante das rápidas incursões, mostra-se bastante controvertida, haja vista existirem argumentos convincentes tanto no sentido da constitucionalidade do artigo 277 do CTB, amparado-a no art. 5º, inciso II da Carta Política de 1988 – "ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei" – e lei há neste sentido, como também no exercício do poder de polícia, ou seja, assegurando-se direitos individuais ameaçados pelo exercício desenfreado e ilimitado de outros direitos, com o fim único de assegurar o bem comum.

Visa a obrigatoriedade do bafômetro, evidentemente consubstanciado em um mínimo de indícios de que o condutor de veículo – alvo da fiscalização de trânsito – esteja sob efeito de álcool, a proteger e a assegurar o direito de um trânsito seguro, um trânsito que não venha a ceifar vidas produtivas e molestar a integridade física de outros tantos cidadãos que esmeram suas condutas de modo a não violar direitos alheios, sempre respeitando as regras do convívio social harmônico, do bem comum.

Ao revés, também com fortes argumentos, encontram-se aqueles outros estudiosos que advertem a população para a inconstitucionalidade do indigitado art. 277, pois que viola o princípio de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo. Citei princípio, pois, em última análise, a máxima citada insere-se nos direitos e garantias individuais por força do disposto no § 2º do art. 5º da Constituição Federal, tendo em vista que remonta à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, da qual o Brasil é signatário.

Assim, diante desse aparente conflito de normas constitucionais, e como bem assevera NERY JR. (8), direitos constitucionais aparentemente em conflito ou antagônicos devem ser harmonizados e compatibilizados entre si pelo intérprete e aplicador da norma, optamos por defender a constitucionalidade do art. 277 do CTB, amparando-o no princípio da proporcionalidade, utilizado com bastante ênfase no direito moderno.

Diz o princípio que deve o julgador e aplicador da norma, diante do aparente conflito de normas constitucionais, sopesar, dentre elas, a que visa à proteção de bem jurídico de maior valor, de maior relevância social.

Assim afirma RIBEIRO LOPES (9): "Os caminhos da proporcionalidade podem fornecer substrato necessário ao equilíbrio entre os direitos individuais atingidos pelo Direito Penal e os direitos da comunidade protegidos pelo mesmo direito".

Cabe ao juiz, parafraseando CANOTILHO (10), "pesar as desvantagens dos meios em relação às vantagens do fim".

Sejamos mais claros. A obrigatoriedade do uso do bafômetro, como dito, diante de mínimos indícios de que o condutor esteja sob a influência de álcool, visa a assegurar o direito à segurança viária e, por via de conseqüência, à vida e à integridade física dos demais usuários da via, segurança esta indispensável à harmonia social.

Ainda assim, poder-se-ia dizer, como, aliás, dizem muitos, que a obrigatoriedade do bafômetro viola a intimidade do suposto infrator, expondo-o a uma situação vexatória, que, a nosso ver, em nada se compara ao vexame da exposição social, sobremaneira, quando a influência do álcool leva o condutor a um acidente de trânsito; mais ainda, a um algoz, quando vem a ceifar vidas humanas.

Teria preocupação alguma com a sua intimidade um condutor que não tem a consciência do mal que faz a si mesmo com a ingestão de bebida alcoólica? Preocupar-se-ia ele com a conduta aética e anti-social de expor milhares de outros usuários da via a uma situação de perigo constante? Entendemos que a reposta negativa se impõe, inclusive quando afirmam os estudiosos da área médica que a influência do álcool libera o cidadão dos inibidores impostos à vida em grupo.

Então, sopesando-se os bens jurídicos tutelados – de um lado a vida e a integridade física das pessoas e, de outro, a intimidade do indivíduo –, cremos dever o aplicador da lei posicionar-se em prol da coletividade, em benefício das milhares de vidas ceifadas anualmente pelo trânsito enfurecido de nossas cidades, em prol daquilo que se tornou, nos dias atuais, o segundo maior problema de saúde pública do país (11).

Entendemos, pois, a utilização do bafômetro como o único meio eficaz – admitindo-se todas as provas em contrário – de se aplicar as normas, tanto administrativas como penais, elencadas no CTB, referentes à embriaguez ao volante.

Ao menos na Cidade do Salvador, onde o laudo do exame clínico, realizado por profissional habilitado da área médica, não chega ao conhecimento do agente de trânsito ou policial militar que representa a imediata autoridade de trânsito (apenas sendo remetido à delegacia que expediu a guia, em torno de trinta dias), não conseguimos enxergar outra maneira de aplicação efetiva da infração administrativa do art. 165 do CTB e, também, do crime do art. 306 do mesmo diploma, embora o tipo penal não faça alusão ao índice de seis decigramas de álcool por litro de sangue, limitando-se o legislador em aceitar a mera influência de álcool, expondo a dano potencial à incolumidade de outrem.

Admitir a prova testemunhal seria um procedimento temerário para o agente do órgão executivo. Vejamos um exemplo: determinada autoridade judicial resolvera autuar um cidadão pelo crime tipificado no art. 306 do CTB, valendo-se da prova testemunhal, conquanto tenha encaminhado o infrator para o instituto médico legal a fim de realizar o exame de sangue. Esse meio de prova (coleta de sangue), diante da negativa do suposto infrator, viola direito individual, por gerar lesão corporal. Resta ao médico o exame clínico, ou seja, tentar detectar as alterações de comportamento, causadas pela influência do álcool, por meio dos conhecidos testes de Romberg: "o paciente fica em pé, com os pés juntos e os olhos fechados. Ocorre comumente um aumento das oscilações naqueles com disfunções do mecanismo cerebral ou vestibular" (12); dedo a dedo; dedo a nariz, etc. Consideremos que, após a lavratura do auto de prisão em flagrante, tenha-se obtido o laudo do exame realizado e o médico tenha atestado que o suposto infrator não se encontrava em estado de embriaguez. Entendemos, na hipótese, perfeitamente aplicável a Lei n.º 4.898/65 (Abuso de Autoridade). Portanto, carece o agente da autoridade de trânsito de um mínimo de começo de prova, e esta prova inicial só se manifesta por meio da utilização do bafômetro.

Ademais, no direito comparado, com destaque para o Código Penal da Espanha (1995), Código da Estrada de Portugal (1994), Code des Débits de Boison e des Mesures contre L’Alcoolisme da França, segundo as lições de ASSIS (13), impõem-se prisão, cumulada, muitas vezes, com multa, para a recusa do motorista em submeter-se a exames próprios para a constatação de possíveis intoxicações.

"O Código de Trânsito do Estado da Pennsylvania (EUA), denominado ‘Penn Code’, impõe presunção legal de que o detentor de um ‘privilégio de dirigir’ consente que seja submetido a um ou mais dos exames previstos em lei, tais como bafômetro, exame de urina ou de sangue" (14).

Assim, os exames são obrigatórios para todo condutor que se encontrar sob fundada suspeita de estar dirigindo sob influência de álcool ou substância entorpecente... Àquele que se recusar à realização dos exames poderá ser imposta penalidade de "suspensão da licença para dirigir", pelo prazo de 12 meses (15).

Com tais argumentos rápidos, devido ao fim a que se destina o presente artigo, afastada a intenção do redator de impor-se às demais e balizadas opiniões em contrário, as quais temos a obrigação moral e intelectual de respeitar – afinal, a discordância é que enriquece o conhecimento –, pretendemos, apenas e tão-somente, fazer ecoar o grito daqueles milhões de cidadãos que tiveram um ente querido sorrateiramente afastado da vida terrena devido à atitude criminosa de um semelhante que não soube inferir os efeitos nefastos do álcool durante a condução de veículo.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Polícia comunitária X envolvimento da sociedade civil organizada

Um pequeno estudo baseado no Livro: “POLÍCIA COMUNITÁRIA – POLÍCIA CIDADÃ PARA UM POVO CIDADÃO”, (BONDARUK,Roberson Luiz,Ten.Cel QOPM, SOUZA, César Alberto, Ten.Cel QOPM –Curitiba: Comunicare, 2004).


“A atividade de Polícia Comunitária é um conceito amplo que abrange todas as atividades voltadas para a solução de problemas, que afetam a segurança de uma comunidade, que devem ser praticadas por órgãos governamentais ou não” Pg 48; 2.1.3.

A Segurança Pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos...?(CF, Art.144 Caput), aqui esta o embasamento jurídico que, dá um pedaço do fardo a cada brasileiro nato ou naturalizado, e que acima de tudo traz a luz da discussão a responsabilidade solidária de cada um de nós, vamos a seguir analisar alguns segmentos e suas responsabilidades sem nos ater, no entanto a termos técnicos a fim de facilitar a leitura.

• A Polícia: A Polícia Militar atua no policiamento ostensivo, especifico de bairros divididos em subsetores, em parceria com a Polícia Civil a qual dentro das possibilidades priorizara o atendimento das ocorrências que forem apresentadas por policiais que participem do patrulhamento comunitário;

• A Comunidade: Participa de todas as fases do processo, do planejamento à implantação, execução e avaliação permanente do processo, em parceria definitiva com o poder público;
• Autoridades Civis Eleitas: Participa dando suporte de vontade política para a concretização do ideal paz social, vontade maior em qualquer sociedade moderna;

• A Comunidade de Negócios: Prestará apoio participando no processo decisório do policiamento comunitário bem como no apoio com recursos financeiros, quando isto não puder ser provido integralmente pelo poder público;

• Outras instituições: Vários setores das Prefeituras Municipais, Ministério Público, Poder Judiciário, cada um em sua missão legal, ira contribuir de forma a solucionar, ou amenizar problemas decorrentes da ausência do poder público na região, fazendo diminuir as diferenças sociais.

• A mídia: Prestará apoio de fundamental importância na divulgação, de informações que sejam de interesse comunitário, mostrando os princípios do sistema, normas de autoproteção e de organização da comunidade, bem como as datas de eventos, reuniões, mutirões entre outros.

A descrição sucinta do envolvimento de algum órgão no principio de Polícia Comunitária não esgota as Possibilidades, cabe a cada um do envolvidos na implantação desta Filosofia, em sua Região explorar este Universo ainda pouco explorado, sabendo que como filosofia a vontade de realizar e desenvolver Polícia Comunitária tem de estar intrínseca em cada um dos profissionais de segurança envolvidos direta ou indiretamente no processo.